Etnografando o consumidor do século XXI
O perfil do consumidor brasileiro tem mudado nos últimos anos. A mudança
é configurada em parte pela ampliação da participação da classe C no consumo e a
queda do desemprego, mas também pelo crescimento no uso das novas tecnologias, principalmente,
o acesso à Internet. Esses são alguns dos fatores que tem impulsionado o crescimento do consumo no Brasil. Dentro
dessa atual configuração, principalmente, em tempos de crise, é fundamental aprofundar o conhecimento sobre o público-alvo
para atrair novos clientes. Uma das formas seria utilizar técnicas de coleta de pesquisa multidisciplinares e, ainda, pouco
exploradas para esse uso. Essa estratégia é fundamental no avanço do conhecimento
de marketing sobre esse novo perfil
do consumidor do século XXI, tão diferente do consumidor de um passado recente,
e ao mesmo tempo tão distinto entre si. Esses consumidores atualmente buscam mais
conveniência, autenticidade e
atendimento de qualidade na sua relação com as empresas.
Como atendê-los em suas novas demandas de
relacionamento com a empresa, se essa, costuma ter um conhecimento tão
superficial a seu respeito?
Quando se pensa em aprofundar conhecimento nas áreas humanas, imediatamente, surge à mente os recursos da metodologia qualitativa de pesquisa,
capazes de trazer essa dimensão complexa dos indivíduos dentro do contexto
social. Entre as técnicas qualitativas disponíveis e ainda pouco exploradas nas
pesquisas de marketing no Brasil
estão os estudos etnográficos.
Os estudos etnográficos têm suas bases na Antropologia e na observação e
levantamento de hipóteses, pois o etnólogo procura descrever o que na sua visão,
ou melhor dizendo, na sua interpretação,
está ocorrendo no contexto pesquisado. A Etnografia dá conta de compreender
qualquer aspecto concernente à Antropologia Cultural que estude os processos da
interação social: os conhecimentos, as
ideias, as técnicas, as habilidades, as normas de comportamento e os hábitos
adquiridos na vida social de um povo.
O etnógrafo escolhe um grupo cultural
que está vivendo o fenômeno foco da investigação e através do discurso e do
relato do próprio membro do grupo, são abordados aspectos relacionados ao seu modo de vida, características de comportamento, dentro de um contexto
social específico, no caso do consumidor serão subculturas basicamente urbanas.
Para fazer uso dessa abordagem são combinadas três técnicas, a observação, a entrevista em profundidade e
o registro em foto, áudio ou vídeo. Dessa forma, uma das características fundamentais da
Etnografia é a presença física do pesquisador, a chamada observação in loco, embora essa técnica se
adapte também ao ambiente virtual, onde a participação do pesquisador em uma
comunidade virtual é parte da característica de um grupo dessa natureza,
configurando-se como uma pseudo-observação
in loco.
A
perspectiva do pesquisador é a de um observador
participante, alguém que escuta, como um flutuante da psicanálise, contudo
essa observação deve ser contínua, profunda e prolongada. Além disso, o
pesquisador poderá reunir dados a partir de informantes gerais e/ou de
informantes-chave. A análise descritiva dos aspectos mais relevantes sobre o
grupo leva em conta a observação realizada, os dados obtidos através de relatos
dos informantes e a interpretação do pesquisador, que imerso no grupo pôde absorver e compartilhar, agregando uma série
de aspectos vivenciais à análise.
É fundamental que esse pesquisador tenha
o domínio de diversos constructos das ciências sociais e da técnica etnográfica,
capacitando-o não só no processo de observação espontânea e dirigida, mas
principalmente, como um teórico capaz de tornar estranho o que é familiar e
imprimir um olhar crítico e construtivo de um novo saber social.
A Etnografia como parte integrante da
etnologia, que se ocupa com o estudo descritivo, classificatório e comparativo
da cultura material, ou seja, dos artefatos encontrados nas diversas sociedades,
pode aproveitar-se dos elementos concretos vinculados ao consumo como uma nova
forma de garimpar artefatos culturais. A prova da adequação do método à realidade contemporânea está na própria
etnografia virtual, ou Netnografia, metodologia de pesquisa que busca a coleta
de dados através do ambiente virtual, monitorando a relação entre consumidor e empresa, entre o consumidor e as marcas, entre o consumidor e os produtos e entre o consumidor e os
demais consumidores. É uma investigação que faz uso dos inúmeros recursos disponíveis
na rede, adequando o olhar investigativo ao novo consumidor que se comporta de forma diferente no
ambiente virtual. Nesse ambiente as escolhas são mais rápidas, os
relacionamentos entre os clientes e as empresas podem ser de curta duração,
porém mais invasivos na sua interatividade com a empresa, há mais exposição das
empresas, produtos e serviços nos relacionamentos virtuais.
É claro que as empresas estão cada vez mais
preocupadas em se relacionarem melhor com os seus públicos e em otimizar suas vendas (físicas e
virtuais). Para isso faz-se necessário ampliar seus investimentos também na investigação, através de pesquisas que contenham os recursos
suficientes para antecipar comportamentos
e tendências, mapeando o rumo para qual esse novo consumidor está se
dirigindo. Na Netnografia são usadas ferramentas quantitativas de monitoramento
do ambiente virtual, indicadores de consumo, análise dos códigos de cada grupo
virtual, entre outras. Porém a interação do pesquisador em comunidades virtuais
direta ou indiretamente é fundamental para a completa análise do fenômeno.
Fica a certeza da contribuição desse tipo de
estudo realizado de forma contínua e detalhada para o entendimento do comportamento humano, direcionado ao consumo, integrando
os ‘status’ on line e off line, desse
mesmo indivíduo. Seus resultados têm enorme potencial na diferenciação entre as empresas, pois contribuem na construção das
estratégias de marketing integrando novos elementos sobre a percepção do comportamento de consumo
voltada a esse consumidor do século XXI.
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